quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Ver Saramago

Se puderes olhar, vê. Se podes ver, repara.

É com esta citação do Livro dos Conselhos d’El-Rei D. Duarte que José Saramago abre seu Ensaio sobre a Cegueira (1995). É um romance de grande impacto. Foi traduzido para vários idiomas, e tem tido inúmeras adaptações artísticas mundiais.




A trama é, de saída, desconcertante: de como uma população inteira se resolve, acometida de súbita e propagante cegueira coletiva. Uma peste. Arrisco ler este “ensaio” como uma reparação (no sentido do “atentar para” e no sentido do “retificar”) da inquietante potência do olhar e das imagens como reguladores singulares da vida humana, e não no óbvio plano estético-filosófico da visão, mas sobretudo (e é como Saramago nos acomete, com seu exímio exercício de imaginação) no plano das práticas mais banais do cotidiano.

Assim, a citação que enforma o livro fica, em sua brevidade, precisamente reveladora: não vemos o que podemos olhar porque naturalizamos o que nos cerca; e não nos damos ao trabalho de reparar naquilo que nos cerca porque banalizamos a nossa visão. Se ela nos fosse extirpada, daríamos conta do quanto ela nos defende dos perigos que nossos próprios automatismos em viver esquecidos do olhar desencadeia.

Aqui vai o site da Centro de Artes da UFF, para vermos mais detalhes sobre a peça, fotos, horários, enredeço etc.

Tem também o trailer do filme homônimo do Fernando Meirelles, que deve entrar no circuito essas semanas:



E para quem quiser ver algo sentimental, aqui tem um vídeo com o próprio José Saramago emocionado depois de ver esse filme. Vale pela sinceridade de suas lágrimas, e pelo ariosto de Johann Sebastian Bach, soando num oboé d’amore ao fundo.



É isso. Depois digam se viram, o que viram no que viram, e o que acharam.

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